Pascom Catedral
Pascom Catedral

Monsenhor Ronaldo Menezes- Vice-Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação

 

Ninguém desconhece que Belém do Pará é a cidade de Beatíssima Virgem Maria. O nome “Belém” está associado ao período do Natal. Não por acaso, portanto, o nome de Santa Maria de Belém; sua fundação em 12 de janeiro de 1616 está no tempo do Natal do Senhor, envolvida ainda pela aura do nascimento do Salvador. A pequena cidade de Davi, por isso, está na memória dos navegantes portugueses que aportaram por aqui no início do século 17. Eles pensam, naturalmente, na Belém de Judá, onde nasceu Jesus; pensam no presépio, pensam na estrela, pensam nos reis magos, pensam nos pastores. Não posso afirmar que Francisco Caldeira Castelo Branco tenha pensado no cumprimento da profecia de Miquéias, segundo a qual Jesus nasceria na cidade de Davi.

O nosso interesse aqui é o fato de que tanto São Mateus quanto São Lucas dizem, claramente, que Jesus nasceu em Belém. Os detalhes do nascimento de Jesus, no relato de São Lucas, são riquíssimos, e são os que temos na memória e no coração. O contraste com o relato do nascimento de João é impressionante. Em todo o rico relato, a Mãe de Jesus está envolvida, mas nela imperam o silêncio e a obediência a Deus. Maria é sempre obediente a Deus! O seu silêncio é sinal de inteira e total confiança em Deus.

Jesus nasceu em Belém. No relato do nascimento de Jesus, porém, uma frase nem sempre bem compreendida, tem se tornado o cavalo de batalha de alguns irmãos para negar a virgindade perpétua de Maria. O evangelista diz que Maria “deu à luz seu filho primogênito”. Como eu disse, alguns irmãos entendem essa frase de São Lucas diferente de nós; acreditam que Jesus seria o primeiro filho de Maria dentre outros que ela teria tido depois. Eles, todavia, não estão corretos. Na linguagem bíblica, o termo não significa sempre que o “primogênito” é o primeiro dos filhos. O termo indica apenas a dignidade e os direitos próprios e as obrigações que esse filho possui. Além disso, São Lucas sublinha a virgindade de Maria. Outra interpretação que se queira dar é excessiva. Para nós, portanto, este é um assunto encerrado. Que Jesus é o Primogênito neste único sentido, e não de que é o primeiro entre irmãos mais novos, é doutrina apostólica, ou seja, corrente na Igreja desde o começo, como São Paulo escreveu em suas cartas. O apóstolo dos gentios escreveu na carta aos Romanos esta afirmação, que eu transcrevo para facilitar nosso entendimento e tirar toda dúvida: “Porque os de antemão ele conheceu, esses também predestinou a serem conformes à imagem do seu Filho, a fim de ser ele o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8,29; leia também Cl 1,15.18). São João não diz coisa diferente no Apocalipse 1,5. Para nós, cristãos da primeira hora, é claro que Maria, a Mãe de Jesus, não teve outros filhos após o nascimento de Jesus. E penso que não devemos entrar em debate com ninguém sobre este assunto.

Quanto à noite de Natal, não é raro as pessoas idealizarem o nascimento de Jesus, quase não se recordando de que o local era um estábulo. O lugar era certamente muito simples, sem nenhum conforto, sem o requinte do quarto de um palácio. Coisa estranha em se tratando do rei do universo, do Senhor dos senhores, diante do qual todos os joelhos se dobrariam. Mas foi assim, desse jeito. Maria age como toda mãe, cuidando do seu filho, dando-lhe como berço uma “manjedoura”, onde os animais comiam. Este berço improvisado era também uma advertência que continua atual; uma pintura na nossa catedral, reproduzida na igreja onde recebi minha primeira comunhão, mostra a manjedoura e dois animais rodeando o Senhor nascido; a advertência nos vem do profeta Isaías, que diz o seguinte: “O boi conhece o seu dono, e o jumento, a manjedoura de seu Senhor, mas Israel é incapaz de conhecer, meu povo não é capaz de entender” (Is 1,3). Noutras palavras: cuidado para não deixarem passar despercebido o Senhor Jesus em suas vidas, não se afastem dele nem o afastem de vocês. Nossa Senhora e São José estão ali, olhando, vivendo intensamente aquele momento divino. Maria, como sempre, em silêncio, guardando tudo no coração. Esta observação de que Maria guardava tudo no coração é importante, porque as maravilhas de Deus não podem ser esquecidas.

Quem tem a graça de ir à Terra Santa em alguma peregrinação, ao chegar a Belém vai, necessariamente, à Basílica da Natividade, um belo santuário mariano do século IV, o mais antigo dedicado à Mãe de Jesus. Todos descemos à gruta do nascimento de Jesus. Esse lugar de grande veneração é citado por São Justino, na obra Diálogo com Trifão, e depois por Orígenes. É uma graça poder ir a Belém, fazer o percurso da Virgem Mãe e viver com Maria o mistério do nascimento de Jesus.

Conto estas coisas, que podem parecer demais, para mostrar o quanto a nossa devoção pela Mãe de Jesus tem suas origens nos Santos Evangelhos. Admito que, às vezes, exageramos na roupagem da nossa devoção, e também reconheço que a Virgem Mãe do Salvador não precisa de tudo isso, o que não significa que não lhe possamos dar sinais do quanto a amamos. Os filhos fazem assim!

Da visita aos pastores, chegados de muito longe, apenas para ver Jesus, Maria guardou as suas impressões, os seus gestos, a perseverança no andar até Belém, a orientação divina pela estrela. E continuou em silêncio contemplativo. Maria nos ensina que há coisas, e muitas, diante das quais não precisamos falar; na verdade, não temos a obrigação de dar opinião sobre tudo. Maria nos ensina o valor do silêncio. 

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