Cardeais exigem ‘transformação econômica radical’

Em documento entregue à COP-30

Cardeais entregam documento na COP 30. | Crédito: Paulo Augusto Cruz / CNBB.
Cardeais entregam documento na COP 30. | Crédito: Paulo Augusto Cruz / CNBB.

“Condenamos o ‘capitalismo verde’, a mineração e o ‘monocultivo energético’, que sacrificam comunidades e ecossistemas; e exigimos uma transformação econômica radical que favoreça as condições para que a vida na Terra prospere”, diz documento assinado por bispos apresentado à 30ª Conferência das Partes das Nações Unidas (ONU) sobre Mudança do Clima (COP 30) que ocorre em Belém (PA) até o próximo dia 21.

“A economia verde, ou o ‘esverdeamento do sistema’, como muitos autores a denominam, é uma lógica técnico-instrumental a serviço da reestruturação ecológica do capitalismo”, diz o documento intitulado “Um chamado por justiça climática e a casa comum: conversão ecológica, transformação e resistência às falsas soluções”.

O documento é assinado pelo bispo de Porto Alegre (RS), cardeal Jaime Spengler, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e do Conselho Episcopal Latino-americano e Caribenho (CELAM); pelo arcebispo de Kinshasa, República Democrática do Congo, cardeal FridolinAmbongo, presidente do Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar (Secam); pelo arcebispo de Goa e Damão, cardeal Felipe Neri Ferrão, presidente das conferências episcopais da Ásia.

O texto exige que nações ricas paguem sua dívida ecológica e pede ações concretas para limitar o aquecimento global a 1,5∘C.

No documento, os cardeais dizem que “o clamor da terra e o clamor dos pobres são um só”, ressaltando que o compromisso cristão com o cuidado da criação deve se refletir em ações concretas de solidariedade, defesa dos povos tradicionais e promoção de um desenvolvimento sustentável e inclusivo.

“Não podemos continuar sustentando sistemas que destroem a vida em nome do lucro. O Evangelho nos chama à sobriedade, à justiça e à partilha”, diz o documento.

Os cardeais signatários participaram do Simpósio Internacional – Igreja Católica na COP30 na última quarta-feira (12), no Colégio Santa Catarina, uma das sedes das atividades paralelas à COP-30 organizadas pela Igreja. O objetivo foi “apresentar as perspectivas da Igreja, reafirmando o compromisso com a justiça climática e a ecologia integral”, disse a articulação Igreja Rumo à COP30.

O seminário começou com a bênção de Nossa Senhora de Nazaré, dada pelo arcebispo de Belém, dom Júlio Akamini. Ele saudou os participantes como anfitrião do encontro na mesa de abertura do evento. A mesa estava composta pelo núncio apostólico no Brasil, dom GiambatisttaDiquattro e pelos signatários do documento.

Os participantes assistiram a um vídeo que dizia: “Crise climática é também uma crise espiritual e moral que exige a nossa conversão ecológica. Com sua voz profética, a Igreja recorda que cuidar da criação é parte indissociável do seguimento a Jesus Cristo, a ressurreição de Cristo é comunicada em todo o esplendor da criação redimida em seu amor e dessa força nós somos testemunhas fiéis”.

Dom GiambatisttaDiquattro disse na abertura do evento que “a conversão ecológica não consiste simplesmente em mudar os comportamentos externos, mas renovar o olhar interior e reencontrar em Deus o princípio o sentido da existência”.

Ele citou o “saudoso papa Francisco e seu providencial magistério”. Francisco ensinou que a mudança climática “não pode ser entendida apenas com uma questão técnica ou econômica, mas como uma abordagem ecológica e social que deve integrar a justiça para ouvir tanto o clamor da terra como dos pobres”, disse o núncio.

A expressão “conversão ecológica” foi usada pela primeira vez por são João Paulo II na Audiência Geral de 17 de janeiro de 2001 ao comentar a passagem do Livro da Sabedoria sobre a missão do homem de “governar o mundo com santidade e justiça”.

A expressão foi retomada pelo papa Francisco na encíclica Laudato Si’, publicada em 2015. Para ele, a “conversão ecológica, comporta deixar emergir, nas relações com o mundo que os rodeia, todas as consequências do encontro com Jesus”.

“Conversão é a palavra grega que traduzimos que é a expressão metanoia, mudança de mentalidade”, disse o teólogo Raylson Araújo, à ACI Digital. “A Igreja, mãe e mestra, chama a atenção para que a gente mude essa mentalidade, a forma como a gente consome, descarta algumas coisas, precisamos mudar essa mentalidade porque isso pode afetar o nosso próximo, irmão, semelhante”.

No simpósio, dom Jaime disse que as soluções para a crise ambiental não podem ser reduzidas a ajustes técnicos e financeiros. “Se faz necessário integrar as cosmovisões e práticas dos povos indígenas e ribeirinhos”, disse. “Habitamos o planeta e precisamos de uma conversão sobre o nosso modo de relação com o planeta com cuidado e promoção do meio ambiente e da vida. Precisamos colocar o cuidado da vida no centro de nossas decisões. Não podemos fazer média com a cultura da morte, somos chamados a ser sementes de Esperança num mundo novo baseados na ética e fé”.

Dar alma à COP 30

“O evento é civil, é da ONU com a participação dos países, mas o nosso papel é dar alma a este acontecimento”, disse o arcebispo emérito de Belém (PA), dom Alberto Taveira, sobre as atividades paralelas à COP 30 organizadas pela arquidiocese de Belém junto com a articulação Igreja Católica Rumo à COP 30.

A arquidiocese de Belém organizou atividades de 11 a 16 de novembro em quatro polos temáticos: um polo no colégio Santa Catarina sobre temas sociais. Um polo na Faculdade Católica de Belém com o tema da educação e saúde. Outro polo no distrito de Icoaraci, no santuário São João Batista, sobre o tema da juventude e o quarto polo em santa Bárbara que foi sobre a dimensão rural, do interior da realidade da Amazônia e do mundo.

Segundo dom Alberto, os eventos foram “organizados com seriedade e à luz do Evangelho”. Todos os polos tiveram momentos de oração e missas diárias.

O objetivo destas atividades foi promover “o cuidado com a Casa Comum, a Ecologia Integral e a Justiça Climática”, diz o site da articulação Igreja Rumo à COP30, iniciativa coordenada pela CNBB junto com a Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), o Movimento Laudato Si’, a Cáritas Brasileira e a Rede Eclesial Pan-Amazônica – Brasil (REPAM).

“Quando nós temos a Igreja falando dos temas do agravamento da crise climática, a esperança, a ideia que transparece é que somos uma instituição muito séria”, disse Araújo. “A Igreja que é mãe e mestra, como diria João XXIII, sabe daquilo que fala e espera que esse ensinamento, possa ser acolhido por outras pessoas, lideranças políticas, pelas demais culturas, para que olhem para o que a Igreja está chamando atenção”.

“Então, quando a Igreja fala do tema do cuidado da casa comum, o que faz é recordar esse mandamento bíblico do cuidado, Adão e Eva, no paraíso, recebem essa missão do criador: cuidar da criação”, continuou ele. “Então cuidamos da vida e daquilo que tem vida em todas as instâncias. Cuidar da vida e cuidar para que esse ambiente no qual estamos inseridos tenha vida é também cuidar do respirar, do plantio, do cultivo”.

Fonte: ACI Digital / Por Nathália Queiroz

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