Francesco protagonista do programa Rai “A Sua Immagine”, gravado em 27 de maio. Entre testemunhos no estúdio, clip de histórias e chamadas em vídeo, o Pontífice reflete sobre os problemas do mundo ou da vida pessoal de cada um. “Existe um prazer em torturar”, diz ele, pensando em imagens de guerra ou até mesmo em bullying. Sobre as aparições marianas, adverte: “Nem sempre são verdadeiras”. Mensagem aos pais: “Educar os filhos à gratuidade, mas sempre com limites”.
“É uma história tão antiga quanto a humanidade: com a paz sempre se ganha, talvez pouco mas se ganha, com a guerra se perde tudo. Todos! E os chamados ‘ganhos’ são perdas.”
Nos estúdios Rai de Saxa Rubra, convidado do programa dominical “À Sua Imagem”, Francisco reverbera o apelo de Pio XII na radiomensagem aos governantes de 1939 quando, às vésperas da Segunda Guerra Mundial, afirmou: “Nada se perde com paz. Tudo pode ser perdido com a guerra.” Francisco faz seu este alerta, pensando no conflito na Ucrânia que fere a Europa, mas também em todas as guerras e violências que marcam o mundo. Há um “prazer em torturar”, observa a esse respeito: “Estamos vendo isso na guerra, nas filmagens de guerra, o prazer… E tantos soldados que trabalham lá torturando soldados ucranianos. Eu vi os filmes. E isso às vezes acontece com os meninos”.
Primeira vez em Saxa Rubra
A guerra é um dos muitos temas ao qual Francisco dedica uma reflexão durante o aprofundamento religioso na Rai Uno, do qual sempre se disse espectador. Uma conversa – a primeira vez de um Papa em um estúdio de TV – conduzida pela apresentadora Lorena Bianchetti e acompanhada pelas intervenções de padre Marco Pozza, capelão da prisão Due Palazzi em Pádua, irmã Agnese Rondi, religiosa de Cottolengo, e outros convidados. A transmissão, episódio especial de “La forza della vita“, foi gravada no último sábado, 27 de maio, quando Francisco havia se dirigido à sede da Rai em Saxa Rubra.
Papel da mídia
Entre chamadas em vídeo, clipes de histórias de vida, testemunhos ao vivo, seguindo o formato tradicional da transmissão, o Papa Francisco revela que nunca esteve em um estúdio de televisão nem de ter assistido muito à TV: “Vou te contar um segredo, quando era jovem ainda não tinha televisão”, brinca com Bianchetti, para então se debruçar sobre o papel que a informação deve desempenhar no atual cenário mundial: “A mídia deve ajudar a se encontrar, a se entender, a fazer amigos e a afastar os diabinhos que arruínam a vida das pessoas. Isso é a positividade, não é somente falar de religião. Pode-se sim, falar de Deus… mas preservar a humanidade, o humanismo”.
O Jubileu, ocasião de perdão
Espaço na conversa para os grandes acontecimentos da Igreja, como o Jubileu de 2025 – ocasião “para aproximar todos entre nós, com Deus, para resolver os problemas, para perdoar” (“Uma das coisas mais bonitas das pessoas é o perdão”, diz ele) -, ou a lembranças pessoais, como a de sua avó Rosa, a primeira a lhe ensinar o amor por Nossa Senhora: “Ela me falava de São José e de Nossa Senhora, mas sempre Jesus no centro”.
Aparições marianas
A centralidade de Cristo é importante, observou o Papa, também para discernir sobre a veracidade das aparições marianas. A aparição “… é um instrumento da devoção mariana que nem sempre é verdade”, adverte. “Houve aparições verdadeiras de Nossa Senhora, mas sempre com o dedo assim, em direção a Jesus. Nunca Nossa Senhora atraiu para si mesma. Quando a devoção mariana é muito centrada em si, não está bem. Quer na devoção como nas pessoas que a levam adiante”.
A gratuidade de Deus
Entre os vários vídeos veiculados durante o episódio, destaca-se o de Fausto Desalu, 29 anos, campeão olímpico de revezamento pela Itália, que conta sua história de renascimento. O jovem fala por video-chamada e pergunta ao Papa: “Tudo bem?”. “Continuo vivo”, responde Francisco, com o espírito brincalhão de sempre.
A história pessoal do jovem dá ao Papa a oportunidade de falar sobre a gratuidade: “O Senhor foi tão bom para nós que nos habituou a ter o sentido da gratuidade. E nós queremos tudo de graça. A gratuidade é uma coisa muito grande de Deus, mas nós devemos fazer a nossa parte… Ninguém pode dar gratuitamente se não experimentou essa gratuidade”.
O “complexo do pavão”
Em contraste com essa atitude de gratuidade, existe o “complexo de pavão”: “Não sei se existe essa categoria na psicologia, mas eu chamo de ‘complexo de pavão’, ou seja, aquele que não é como o pavão se sente pouca coisa. E tem aquele homem, aquela mulher que vai trabalhar, capaz de comprar uma casa, de constituir família. Nenhum deles faz o papel de pavão! Mas aqueles que são um pouco superficiais caem na tentação do pavão, o buscar aparecer, fazer de conta de…”. “Não é esse o caminho”, diz o Papa, “a vida é para viver, não para ser maquiada”
Do Papa também uma reflexão sobre o sofrimento. O Senhor, diz ele, citando o Gênesis, “não quer que soframos, mas quer a harmonia do refazer… Com isso o Senhor nos colocou protagonistas no progresso do destino. Se tu tens a possibilidade de ter tudo, perde a graça de ser um co-criador, de ter uma família, de levar em frente os filhos, de receber a sabedoria dos velhos, mas esse é o trabalho. O trabalho está no coração da humanidade”.
A propósito da dor, entram no estúdio de surpresa Matteo e Serena, pais da pequena Angélica, a menina gravemente doente de 5 anos que morreu um dia antes da alta do Papa da Policlínica Gemelli. Francisco os havia encontrado em frente ao hospital e o abraço do Papa à mãe em lágrimas viajou pelo mundo.
Diante de histórias do gênero, o Papa recorda a importância da “ternura” e de “acompanhar a dor”: “Também eu fui acompanhado no momento da dor. Uma coisa que aprendi, quando tive aquela doença aos 21 anos, quase até a morte: diante da dor somente os gestos, as palavras são servem… Não há palavras para a dor, somente os gestos, e o silêncio”.
Educar à mansidão
O Papa então ouve a história de Diana Ghini, 19, que sofreu bullying devido a sua forma física e também por sua irmã com grave deficiência. “A maldade é uma das possibilidades da pessoa”, comenta o Papa. Os jovens que perpetram o bullying “parecem vencedores”, mas “é uma vitória falsa porque é uma vitória sobre a agressão, sobre a dor dos outros”. A verdadeira vitória é harmoniosa, não é agressiva, é branda. A verdadeira palavra é mansidão. Hoje não educa tanto para a mansidão, porque nos faz entender que ser manso significa ser estúpido”.
Também ele, Jorge Mario Bergoglio, recebeu palavras que o magoaram: “Quando jovem, quando criança…”. Inicialmente reagiu “engolindo”, depois “dizendo…, mas eles dizem isso, mas eu mereço por isso, aquilo e aquilo, e tomando isso como uma palavra que me faz justiça por dentro”.
Mensagem aos pais e professores
O Papa reafirma aquele que é o “estilo” de Deus: “Proximidade, compaixão e ternura”. Isso deve ser ensinado às crianças: “Não há saída: ou escolhemos o caminho do amor, da ternura, ou escolhemos o caminho da indiferença”.
Mas atenção, diz aos pais: “É preciso educar sobre limites. Se tu tens um jovem, uma jovem, um menino, uma menina, e os faz crescer sem limites, estás fazendo mal. Precisam de carinho, de amor, mas também do “não” de amor. Não aos caprichos”.
O mesmo discurso para os professores: “Um mestre que somente te dá balas, não está bem. O mestre é aquele que te ajuda a caminhar, mas te diz o limite e te repreende. E um pai e uma mãe que não repreendem um filho, há algo está errado”.