Conversa com meu povo: À beira do poço de Jacó

Em nossa caminhada quaresmal, somos ajudados por uma mulher da Samaria, mas desejamos ser conduzidos, neste Ano Mariano Nacional, pelas mãos da Virgem Maria, Mãe de Misericórdia, que volta para nós seu olhar e nos mostra Jesus. Na Arquidiocese de Belém, esta será uma semana especial, com a chegada e peregrinação da Imagem de Nossa Senhora Aparecida. Unimo-nos a todo o Brasil, no terceiro centenário do encontro de sua imagem, no Rio Paraíba, para percorrer as sete regiões episcopais de nossa Igreja, em romaria pelas Paróquias com títulos marianos. Vamos, mais uma vez, ao encontro das raízes marianas de nossa formação na fé, sabendo que Maria nos conduz a Jesus, seu Filho amado.
 
 

   
 
 

Jesus é a Palavra Eterna do Pai que se faz carne, entrando nos ambientes e no relacionamento das pessoas de seu tempo. Inclusive as intrigas tribais e inimizades que atravessam gerações são como que tocadas por ele, para estabelecer novos critérios no trato com as pessoas. Imaginemos o quanto seus próprios discípulos se espantaram ao vê-lo conversando sozinho com uma mulher, no olho das desconfianças entre judeus e samaritanos, que se fizeram inimigos históricos! Tanto é verdade que dois discípulos do círculo que lhe era mais próximo (Cf. Lc 9, 51-56), Tiago e João, foram repreendidos ao desejar que caísse fogo do céu sobre samaritanos que não os acolheram. E sabemos que, em outra ocasião, foi a figura de um samaritano que Jesus tomou para reconhecer o modelo do amor ao próximo e do serviço, na parábola do “bom” samaritano (Cf. Lc 10, 25-37), convidando a “fazer o mesmo” que um samaritano (Lc 10, 37). Agora, à beira do poço. No episódio colocado diante de nossos olhos, numa viagem da Galileia para a Judeia, “era preciso que ele passasse pela Samaria. Chegou, pois, a uma cidade da Samaria, chamada Sicar, perto da propriedade que Jacó tinha dado a seu filho José. Havia ali a fonte de Jacó. Jesus, cansado da viagem, sentou-se junto à fonte. Era por volta do meio-dia” (Jo 4, 4-6). Certamente “era preciso”, para que nenhum de nós pense ser fortuito o encontro com a Samaritana. Era preciso para sua vida e salvação! Era preciso para que todos nós nos aproximemos do mesmo poço, com nossas histórias e perguntas com nossos mistérios mais profundos.
 
Vale observar a carga de humanidade que a cena descrita pelo Evangelho de João comunica! Jesus é Deus, mas tem sede, precisa descansar assentado à beira de um poço, no maior calor do dia, pede água, conversa, provoca, escuta, fica sabendo de histórias familiares, acolhe pessoas, é gente!
 
Desejamos visitar Sicar (Jo 4, 1-42), onde se encontra o Poço de Jacó e Jesus conversou com a Samaritana. Esta entrou de forma tão delicada e ao mesmo tempo forte no Evangelho, tornando-se anunciadora do Cristo, que lhe revelou tudo o que tinha feito. Através de Sicar, visitamos as famílias de nosso tempo, no estado em que se encontram, mesmo aquelas que já estiverem na quinta união! Trata-se de olhar para cada família, começando da nossa, com suas qualidades e defeitos, para, assentados à beira do poço de Água viva, que é o Filho da Virgem Maria, beber da fonte de água pura (Cf. Jo 4, 10), para a santidade do matrimônio e da família. Não percamos de vista o ideal a ser alcançado e, ao mesmo tempo, tenhamos os sentimentos de realismo e misericórdia diante do que se vive hoje.
 
“Cada família tem diante de si o ícone da família de Nazaré, com o seu dia-a-dia feito de fadigas e até de pesadelos, como quando teve que sofrer a violência incompreensível de Herodes, experiência que ainda hoje se repete tragicamente em muitas famílias de refugiados descartados e inermes. Como os Magos, as famílias são convidadas a contemplar o Menino com sua Mãe, a prostrar-se e adorá-lo (Cf. Mt 2, 11). Como Maria, são exortadas a viver, com coragem e serenidade, os desafios familiares tristes e entusiasmantes, e a guardar e meditar no coração as maravilhas de Deus (Cf. Lc 2, 19.51). No tesouro do coração de Maria, estão também todos os acontecimentos de cada uma das nossas famílias, que ela guarda solicitamente. Por isso pode ajudar-nos a interpretá-los de modo a reconhecer a mensagem de Deus na história familiar” (Papa Francisco – Amoris Laetitia 30).
 
Os homens e as mulheres chamados a esta belíssima vocação são convidados a renová-la na Quaresma, e todos estamos unidos pela santificação de nossas famílias. Diante das famílias, desejamos oferecer o serviço da consolação: “A misericórdia possui o rosto da consolação. ‘Consolai, consolai o meu povo’ (Is 40, 1): são as palavras sinceras que o profeta faz ouvir ainda hoje, para que possa chegar uma palavra de esperança a quantos estão no sofrimento e na aflição. Nunca deixemos que nos roubem a esperança que provém da fé no Senhor ressuscitado. É verdade que muitas vezes somos sujeitos a duras provas, mas não deve jamais esmorecer a certeza de que o Senhor nos ama. A sua misericórdia expressa-se também na proximidade, no carinho e no apoio que muitos irmãos e irmãs podem oferecer quando sobrevêm os dias da tristeza e da aflição. Enxugar as lágrimas é uma ação concreta que rompe o círculo de solidão onde muitas vezes se fica encerrado” (Papa Francisco, Misericordia et Misera, 13).
 
Há muitos poços de Jacó espalhados pelas nossas cidades, esperando alguém que chegue em nome de Jesus para escutar e refazer estradas, sem medo de ir ao fundo das interrogações humanas e da diversidade de situações familiares, que clamam por presença e consolação. Há gente com sede de água viva gritando por socorro, clamando por cristãos que aceitem ser pequenos e simples, começando de novo, sem se escandalizarem com histórias de dor e lágrimas. Saibam os que acolherem o convite que podem estar escondidas por estas paragens muitas pessoas que no futuro dirão como os concidadãos da mulher samaritana. “Já não é por causa daquilo que contaste que cremos, pois nós mesmos ouvimos e sabemos que este é verdadeiramente o Salvador do mundo” (Jo 4, 42).

 

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