Conversa com meu povo: Deixai-vos reconciliar com Jesus

Foto: Luiz Estumano.
 
Abre-se a porta do tempo da Quaresma, com nossos olhos voltados para a Páscoa. Este é um caminho precioso, um tempo favorável, a ser aproveitado com diligência por todos. Para nossa Arquidiocese de Belém, este é também o tempo de abrir as portas a Deus e a todos, para darmos nossa contribuição. E nossas cidades se encham de alegria, com a presença e a graça do Senhor Jesus, em seu Mistério pascal de Morte e Ressurreição.
 
Abram-se as portas dos corações para Deus! O Papa Francisco tomou como tema da Quaresma do corrente ano a palavra do Apóstolo São Paulo: “Foi o próprio Deus que, em Cristo, reconciliou o mundo consigo, não levando em conta os delitos da humanidade, e foi ele que pôs em nós a palavra da reconciliação. Somos, pois, embaixadores de Cristo; é como se Deus mesmo fizesse seu apelo através de nós. Em nome de Cristo, vos suplicamos: deixai-vos reconciliar com Deus” (2 Cor 5,19-20).
 
Quando tantas nuvens nos dificultam enxergar a vida e as luzes que vêm de Deus, o apelo primeiro é deixar-nos reconciliar com Deus, olhando para a frente e para o alto. Para tanto, faz-se necessário o reconhecimento sincero e humilde de nossa condição de fragilidade, pecadores que somos, marcados muitas vezes pela indiferença e pela insensibilidade. Se não podemos sozinhos alcançar tal docilidade, saibamos pedi-la ao Espírito Santo: “Ó luz maravilhosa, invade intimamente o coração dos fiéis. Sem a tua força nada há no homem, nada que não seja culpa. Lava o que é impuro, rega o que é árido, cura o que sangra, dobra o que é duro, aquece o que é frio, acerta o que é torto” (Sequência da Solenidade de Pentecostes). 
 
Deus está gritando o chamado à conversão, inclusive através dos muitos fatos negativos dos dias que correm. Não nos é lícito ceder ao mal e ao pessimismo. Reconhecendo o olhar e o clamor de Deus através da Igreja e dos acontecimentos, outro passo é voltar para a casa do Pai. Com grande clareza, a Igreja nos convida a uma mentalidade de conversão, que significa rever corajosamente a vida e os critérios com os quais tomamos as decisões. Pensar as coisas do jeito de Deus (Cf. Mc 8,27-33), ter coragem para recomeçar, escolher caminhos correspondentes àquilo que a Palavra de Deus nos revela, atenção aos ensinamentos da Igreja. E temos à disposição a graça de um Sacramento, a Penitência ou Reconciliação. É hora de “dar trabalho” aos sacerdotes, durante a Quaresma. Cada cristão procure informar-se em sua Paróquia a respeito dos horários de atendimento, que são muitos, durante a Quaresma, inclusive com os mutirões de confissões, oferecidos por toda parte. 
 
Para a prática penitencial da Quaresma, temos à disposição três caminhos que sempre acompanharam a Igreja. O Jejum, que pode ser entendido como mortificação, abstinência ou gestos voluntários que expressem o desejo de educar os sentidos. Quando muitas pessoas fazem dietas ou regimes rigorosos por motivos de saúde ou estéticos, a sabedoria da Mãe Igreja propõe, há séculos, a educação da vontade e o controle dos próprios instintos, sem complicações. E podemos ampliar para o jejum dos passos, saindo de nós mesmos para ir ao encontro do próximo, da língua grande e fofoqueira, quem sabe o jejum de televisão ou redes sociais, para chegar ao jejum do coração e eliminar de dentro dele os sentimentos de inveja, ciúme e inimizade. A oração mais intensa e frequente, com a participação na Santa Missa e nos Sacramentos, a Via-Sacra, ou a Leitura Orante da Palavra de Deus, com o Retiro Popular proposto pela Arquidiocese. E a esmola ou caridade, indo ao encontro dos irmãos mais necessitados durante a Quaresma. Para nosso país, a caridade quaresmal tem a Campanha da Fraternidade, com o tema “Fraternidade e vida: dom e compromisso”, com o belíssimo lema “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Lc 10,33-34).
 
Entretanto, abre-se também uma outra vertente, suscitada pelo Sínodo Especial para a Amazônia e a Exortação Apostólica “Querida Amazônia”, a necessidade de uma conversão pastoral (Cf. Documento final do Sínodo dos Bispos 21-22), o que corresponde aos apelos quaresmais de mudança de vida. Ao voltar-nos mais para Deus e viver reconciliados com ele, sabemos que a Igreja toda e a nossa Igreja de Belém têm vocação missionária, com origem no “amor fontal de Deus” (Concílio Vaticano II, Ad Gentes 2). O dinamismo missionário que brota do amor de Deus se irradia, expande, transborda e se espalha em todo o universo. Somos inseridos pelo batismo na dinâmica do amor através do encontro com Jesus, que dá um novo horizonte à vida (Cf. Documento de Aparecida 12). Este transbordamento impele a Igreja à conversão pastoral e nos transforma em comunidades vivas, a serviço da evangelização. A Igreja é missão! “A atividade missionária «ainda hoje representa o máximo desafio para a Igreja” (Evangelii Gaudium 15). 
 
Queremos ser cada dia mais uma Igreja samaritana, como nos estimula a Campanha da Fraternidade que agora começa, do modo do Filho de Deus, que “assumiu as nossas dores e carregou as nossas enfermidades” (Mt 8, 17b), aquele que se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza (Cf. 2 Cor 8, 9), por meio do seu Espírito, exorta os discípulos missionários de hoje a saírem ao encontro de todos, especialmente dos pobres e excluídos da sociedade. Desejamos também uma Igreja Madalena, que se sinta amada e reconciliada, que anuncie com alegria e convicção o Cristo crucificado e ressuscitado, e uma Igreja mariana que gera filhos para a fé e os educa com afeto e paciência. Queremos ser uma Igreja servidora, querigmática, aqui mesmo e nos horizontes missionários que se abrem.
 
Quem busca a reconciliação com Deus encontra em sua santa vontade o caminho para a realização da própria vida. E esta vontade de Deus há de conduzir-nos, nesta Quaresma, a um espírito de paz e reconciliação dentro da Igreja. Cada Paróquia, Comunidade, Pastoral, Movimento, Grupo ou Serviço acolha o convite a rever os relacionamentos entre pessoas e setores de atividade. É hora de vencer as distâncias, indo ao encontro dos outros, superar julgamentos, ciúmes e preconceitos. Uma Igreja de portas abertas há de acolher continuamente aquelas pessoas que estão ou se sentem excluídas. Não se trata de proclamar como corretas atitudes ou posições não correspondentes à Palavra de Deus ou à Doutrina da Igreja, mas valorizar as pessoas, sua procura sincera, seu desejo de acertar, construindo pontes ao invés de edificar muros que separem, aceitar que existe um processo, um caminho gradual para a vida de tantos irmãos e irmãs, aos quais iremos com amor e espírito de diálogo, por ter recebido a missão, com a qual descobriremos o bem imenso presente em tantas pessoas e situações. Possamos dizer com São Paulo: “Somos embaixadores de Cristo; é como se Deus mesmo fizesse seu apelo através de nós. Em nome de Cristo, vos suplicamos: deixai-vos reconciliar com Deus” (2 Cor 5,19-20).

 

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