Podemos ler e meditar o Evangelho de muitas formas, percebendo as atitudes de amor e misericórdia, curas, pregações de Jesus. Outra forma é olhar para a comunicação de Jesus, ou seja, como Ele se relaciona com as pessoas, como fala com elas a partir de seu dia a dia, a linguagem que usa para que compreendam o amor do Pai e o quanto são amadas.
Na prática, ler o Evangelho na ótica da comunicação é olhar como Jesus se comunica com as pessoas nas mais diversas situações. Observar suas atitudes com os doentes, os que estão à margem da sociedade, os que O procuram para dar um sentido à própria vida: mulheres, crianças, fariseus, quem O buscava para se libertar das amarras e pecados, entre outros.
As narrativas dos Evangelhos trazem textos que revelam claramente a comunicação de Jesus. Basta observar como olha, escuta, acolhe, o que diz, o que pede para fazerem, o que silencia. O olhar que contempla a vida e as atitudes de Jesus alimenta os pensamentos e as atitudes, contribuindo para cultivar a mística da comunicação no cotidiano.
Como acontece a comunicação no caminho de Emaús
Muitos são os textos que ilustram essa realidade, mas vamos acenar para este que revela a comunicação de Jesus, no caminho de Emaús (Lc 24,13-35): os discípulos voltavam tristes e desolados e Jesus aparece e caminha com eles, escuta o que têm a dizer, escuta suas tristezas e frustrações. Faz memória das Escrituras, ajuda-os no caminho interior de percepção da realidade, faz perguntas, dialoga. Esse processo de caminhar juntos faz com que o coração dos discípulos vá criando condições de mudança interior, mas eles só O reconhecem quando senta à mesa, parte o pão e o dá.
Pode-se observar como essa experiência com Jesus ressuscitado transforma o coração dos discípulos. Faz arder o coração, tira-os do medo e faz com que se coloquem de novo a caminho, com nova perspectiva, a de missionários da ressurreição, anunciadores e testemunhas do Cristo aos seus irmãos: “Então, os dois contaram o que tinha acontecido no caminho e como tinham reconhecido Jesus quando Ele partiu o pão”.
A caminho de Emaús (Lc 24,13-35)
Leia o texto e observe o contexto. O texto é colocado após a narrativa do sepulcro vazio. As mulheres e os discípulos vão ao túmulo e o encontram vazio, com apenas os lençóis. Todos estão na expectativa do que possa ter acontecido com Jesus de Nazaré. Dois discípulos iam a um povoado chamado Emaús e conversavam a respeito de tudo o que tinha ocorrido. Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus aproximou-se e pôs-se a caminhar com eles. “Seus olhos, porém, estavam impedidos de reconhecê-Lo”. E Jesus lhes diz: “Que assuntos são esses que discutis enquanto caminhais?”.
Observe que o texto bíblico diz que o semblante dos discípulos estava triste, portanto, lê-se a decepção e a frustração que os abalava. E um dos deles, chamado Cléofas, diz a Jesus: “És tu o único que vive em Jerusalém que não sabe os fatos que nela aconteceram nestes dias?” E continua o diálogo entre Ele e os discípulos. Jesus recorda as Escrituras, muito bem conhecidas por eles.
E, enquanto caminham para o povoado, Jesus vai explicando as Escrituras até que, ao se aproximarem de Emaús, Ele fez menção de prosseguir, mas eles insistem: “Permanece conosco, porque é tarde e o dia declina”. Então, Jesus entrou para permanecer com eles. Observe em que momento e de que forma os discípulos fazem a descoberta da pessoa de Jesus. Quando Ele mostra os sinais, senta à mesa com eles, toma o pão, pronuncia a bênção, parte e lhes entrega. “Seus olhos foram abertos e O reconheceram; mas Ele tornou-se invisível para eles” (v.31). No momento da descoberta, o verbo está na voz passiva: seus olhos foram abertos, como por um dom do Ressuscitado que os toca e transforma seu olhar e a percepção da realidade, conforme atestam: “Não estava ardendo o nosso coração quando falava no caminho, quando nos abria as Escrituras?” (v. 32).
Por sua vez, o encontro com o Ressuscitado abre seus olhos, muda seu estado de ânimo pela presença divina que os transforma de desanimados e medrosos, em discípulos missionários: “Naquela mesma hora, levantaram-se e voltaram para Jerusalém, onde encontraram reunidos os Onze e os que estavam com eles” (v.33). Os discípulos contaram tudo o que tinha acontecido e como O tinham reconhecido ao partir o pão.
Pedagogia de Jesus
Observe, neste texto, a pedagogia de Jesus que se aproxima, caminha com os discípulos, entra na dor deles, escuta, vai fazendo memória, pelas Escrituras, e o caminho interior da descoberta do Ressuscitado. É na experiência com Jesus ressuscitado que somos transformados, conforme assegura o Documento de Aparecida: “Não se começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande ideia, mas por meio do encontro com um acontecimento, com uma Pessoa” (DAp nº 243).
De fato, para uma missão eficaz na Pastoral da Comunicação, é preciso estar com Jesus na Jerusalém em que tudo acontece, no dia a dia, no “areópago” e, também, na Emaús, no aconchego, na celebração com os irmãos. Dessa forma, Eucaristia e Palavra se tornam fonte viva da espiritualidade de quem vive e comunica Jesus Cristo Caminho, Verdade e Vida, em uma comunicação profética e comprometida com uma sociedade humana, cristã e solidária.
Fonte: Jornal O São Paulo / Por Irmã Helena Corazza, FSP