Por Mons. Ronaldo Menezes – Vice-Presidente da Rede Nazaré de Comunicação
Tenho acompanhado com interesse a crescente devoção a São Miguel Arcanjo, cuja festa litúrgica a Igreja celebra no dia 29 de setembro. Penso que nem todas as pessoas devotas conheçam o fundamento bíblico desta saudável devoção, as raízes bíblicas nas quais a Igreja tem se amparado para celebrar a festa do Anjo do Senhor que combate por Deus e nos defende das investidas do Mal. Eis o motivo que me levou a falar de São Miguel nas Sagradas Letras. Seu nome, “Miguel”, significa “Quem é como Deus?”; e sabemos quem ele é: um dos príncipes supremos do mundo celestial, segundo o profeta Daniel (10,13). Este nome “Quem é como Deus” é, na verdade, um grito contra aqueles que pretendem ter poder semelhante ao do Senhor onipotente, para dizer-nos que desde o início, este Príncipe do céu está em luta contra os anjos rebeldes e seus seguidores, que desejaram apossar-se deste poder, e fracassaram por causa de São Miguel, que atua de modo permanente contra todos os espíritos malignos que infestam o mundo e perturbam as pessoas, pretendendo vingar-se por sua queda, levando-as pelos caminhos longe do Criador. O Arcanjo São Miguel é citado, explicitamente, quatro vezes nas Sagradas Escrituras: no relato da grande visão que o jovem Daniel teve e da aparição do Anjo Miguel, que veio em seu auxílio (Dn 10,9-14). Daniel transfere para o Anjo do Senhor, Miguel, o encargo de repelir o demônio, de combater por ele; esta mesma batalha travada por São Miguel contra o demônio é descrita no livro do Apocalipse, capítulo 12,7-12, pois Miguel é o protetor do povo de Deus.
Ainda no livro do profeta Daniel, lemos este versículo sobre a atuação do Anjo São Miguel contra a investida dos detratores de Deus, do anticristo dos últimos dias, quando haverá grande tribulação, uma verdadeira guerra espiritual: “Nesse tempo, levantar-se-á Miguel, o grande Príncipe, que se conserva junto dos filhos do teu povo” (Dn 12,1), ou seja, o Anjo do Senhor que não descanse pela segurança dos filhos de Deus, sempre vigilante e cuja ação é poderosa e libertadora.
O outro texto no qual aparece o nome de Miguel, encontramos na Carta de São Judas, o Diabo reclamando o corpo de Moisés; nessa referência, diz o Apóstolo: “No entanto, o Arcanjo Miguel, quando disputava com o Diabo, discutindo a respeito do corpo de Moisés, não se atreveu a pronunciar uma sentença injuriosa contra ele (o diabo), mas limitou-se a dizer: “O Senhor te repreenda!” (1,9), aludindo a uma antiga crença judaica encontrada no apócrifo ‘A Assunção de Moisés’. Isto significa que o juízo pertence a Deus, o julgamento, inclusive do Demônio, é de Deus, do qual a espada é do Arcanjo Miguel.
O quarto texto está no livro do Apocalipse de São João, onde lemos a famosa passagem do capítulo 12, na batalha entre a Mulher, que representa a Igreja, e o Dragão: “Houve então uma batalha no céu: Miguel e seus anjos guerrearam contra o Dragão. O Dragão batalhou, juntamente com seus Anjos, mas foi derrotado, e não se encontrou mais um lugar para eles no céu” (12,7). A verdade implícita neste texto é a vitória de Deus sobre o mal, cuja ação exterminadora vem pelas mãos de Miguel e de seus Anjos, que continuam fiéis ao Senhor. Esta batalha, que começou no início dos tempos, terminará, no final dos tempos, com a derrocada de Satanás e de seus seguidores. Mas, entre o começo e o fim, está Miguel a nos defender contra as insídias do Maligno.
Em outras passagens da Escritura, embora o seu nome não seja citado, talvez seja Miguel que esteja presente como guardião, voz ativa, mão poderosa do Criador, como, por exemplo, no portão do paraíso, o Éden, para guardar o jardim divino; assim diz o autor sagrado: Deus “baniu o homem e colocou, diante do jardim do Éden, os querubins e a chama da espada fulgurante para guardar o caminho da árvore da vida” (Gn 3,24). Não seria “a espada fulgurante” o próprio Miguel, o chefe do exército celeste? E quem parou Balão com sua jumenta no caminho quando se dirigia para amaldiçoar o povo de Deus? Não teria sido Miguel, “o Anjo do Senhor” (Nm 22,22)? Quem exterminou o exército de Senaqueribe na noite da vingança de Deus, matando no “acampamento assírio cento e oitenta e cinco mil homens” (2Rs 19,35)? O Anjo do Senhor! Não seria Miguel este Anjo do Senhor?
Então, a confiança que vejo no poder da invocação do Arcanjo São Miguel, nas novenas, na sua Quaresma, nas orações, nos exorcismos, que se espalham no meio de nossas comunidades, entre adultos e jovens, não me parece ser uma “simples devoção”, como ouvi de um colega sacerdote. Não! É a expressão da confiança que a Sagrada Escritura nos faz depositar neste Anjo de Deus, cuja missão é, entre outras, a de combater Satanás e seus Anjos, resgatando, libertando, defendendo, protegendo os filhos de Deus, os discípulos de Jesus Cristo, os membros da Igreja do Senhor, das mãos, das garras, das astúcias do Diabo. Nada mais justo e necessário, também nos dias de hoje, continuar a pedir a intercessão e a intervenção de São Miguel nos combates e lutas que travamos para mantermo-nos fiéis ao Senhor e jamais ceder às investidas do Mal.