Por Derik Luiz, postulante Barnabita
Ao debruçar nosso olhar sobre o mistério da criação, é possível perceber um certo viés que liga a narrativa da origem do mundo em Gênesis com o prólogo do Evangelho de João. Ambos evidenciam a poderosa manifestação de Deus, que cria e que santifica. Em João, vislumbramos a intensidade da ação criadora que atesta que o Verbo vindo ao mundo (Jo 1,14) é o mesmo pelo qual tudo passou a existir (Jo 1,3). A riqueza dos fatos narrados no prólogo sustenta a ideia joanina enaltecendo o poder que emana do alto, que por meio do Verbo cria tudo e na mesma medida passa a agir na vida do homem afim de livrá-lo da corrupção do pecado. O Verbo que participa da mais perfeita comunhão e que encontramos no prólogo é aquele que dá a vida e a faz em plenitude, distribui a luz que emana da trindade como força para criar o novo, mas também, este mesmo Verbo se põe a levantar a humanidade decaída em consequência do pecado.
De maneira consistente, os textos sagrados iniciam com a mesma expressão “No princípio”, que figura o ato da criação, mas também o determinado momento anterior ao mundo em que tudo centrava-se em Deus. O verbo “era Deus” (Jo 1,1) e “por ele tudo foi feito” (Jo 1,3) são determinantes para enfatizar que a presença do Logos, isto é, a Palavra, necessariamente é Deus, é Ele que cria as coisas em Gênesis e que anterior a este episódio já estava no princípio de tudo, que sempre foi Deus e assim sendo não se encerra a um ponto de partida. O Verbo é, antes mesmo da criação de tudo. Esta certeza possibilita nosso evangelista a afirmar que “todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e, sem ele, nada do que foi feito se fez” (Jo 1,3).
Três citações entrelaçam esta relação entre os textos sagrados presentes já no início de cada livro. A primeira retirada de Gênesis: “No princípio criou Deus” (Gn 1,1) e “No princípio era o Verbo” encontrada em João 1,3; Depois vemos ainda em Gênesis “Façamos o homem à nossa imagem” (Gn 1,26) e “O verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus (Jo 1,1-2); e por fim em Gênesis “Assim os céus e a terra e todo seu exército foram acabados” Gn 2,1) e “Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez” (Jo 1,3). A ideia centrada é que o Verbo, que é Deus, é a ferramenta de toda criação por vontade do Pai e é no mesmo Verbo que tudo se fará novo. O Verbo é o agente criador, é instrumento da ação, neste sentido, todas as coisas são por intermédio dele, Jesus. O verbo agora encarnado mostra a abertura de Deus em criar e restaurar todas as coisas. Pensemos que a luz que resplandece nas trevas é a mesma luz que ilumina a vida do homem no campo espiritual. A luz do Verbo iluminou o ato da criação e segue brilhando na escuridão da humanidade caída.
O prólogo se refere a Jesus em sua preexistência ao mesmo tempo que em Gênesis manifesta seu relacionamento com o Pai e sua função na obra. Ele vem ao mundo como dissemos, afim de recriar o que por Ele já havia sido feito. Vem para restaurar no homem seu traço mais precioso que lhe foi dado no momento da criação, a imagem de Deus.