
A palavra sinodalidade tem ganhado destaque nas reflexões e práticas da Igreja na atualidade, especialmente a partir do pontificado do Papa Francisco, que convocou o Sínodo da Sinodalidade e enfatizou que não podemos deixar que a palavra vire apenas um slogan, ela precisa ser praticada e vivenciada.
Mais do que uma metodologia, a sinodalidade é uma vivência eclesial que busca integrar todo o Povo de Deus em um processo de escuta, discernimento e participação ativa na missão evangelizadora. Essa ação propõe uma Igreja participativa, aberta à ação do Espírito Santo, onde pastores e fiéis compartilham responsabilidades e decisões, reafirmando a vocação comunitária e missionária da fé cristã.
Embora o conceito de sinodalidade pareça recente, suas raízes se encontram nos primeiros séculos da Igreja, inspiradas na convivência dos apóstolos e nas práticas das comunidades cristãs primitivas.
Para nos ajudar a compreender como a sinodalidade já existia muito antes na história da Igreja, entrevistamos o Missionário Redentorista e historiador, Pe. Inácio Medeiros, C.Ss.R., que contribuiu com seu conhecimento para iluminar a nossa compreensão acerca do tema.
Confira a entrevista:
O que é a sinodalidade e como a Igreja a compreende hoje?
O termo vem do grego syn-hodos, e significa “caminhar juntos”. Sinodalidade é uma prática que deve levar os cristãos a “caminharem juntos”numa Igreja que coloca as mulheres e os homens de nosso tempo, incluindo os pastores e o próprio sucessor de Pedro, aberta para as inspirações do Espírito Santo, porque somente desta forma poderá enfrentar os sérios desafios de nosso tempo.
A sinodalidade representa um caminho de renovação para a Igreja, promovendo sua abertura à ação do Espírito Santo, ouvindo o que Deus tem a dizer ao seu povo.
A sinodalidade é uma prática recente ou tem raízes nos primeiros séculos da Igreja?
A sinodalidade é uma prática antiga feita como caminho de uma Igreja inspirada no exemplo dos doze apóstolos de Jesuse das primeiras comunidades cristãs que a levaram a ter uma dinâmica expansiva, missionária e fraterna, “um hospital de campanha, e não um parlamento” como disse o Papa Francisco ao convocar o Sínodo da Sinodalidade.
A sinodalidade vai muito além da simples organização ou de uma metodologia, sendo um aspecto fundamental da própria natureza da Igreja, com um horizonte teológico e espiritual, às vezes imperceptível.
Uma Igreja sinodal é uma Igreja relacional onde todo o Povo de Deus caminha junto, onde todos, batizados, discípulos missionários, qualquer que seja a sua vocação e a sua posição, se reencontram na interdependência e na mutualidade. Apesar dos altos e baixos da história, a Igreja, para ser sinal do Reino de Deus, deve viver intensamente o seu “Ser Igreja em saída”.
Quais são os primeiros registros de práticas sinodais na Igreja primitiva?
Na vida de comunhão e, na prática da caridade, colocando os bens em comum em vista do atendimento dos mais necessitados descrita em Atos dos Apóstolos(At 2,42-47).
As raízes da sinodalidade podem ser também encontradas no Concílio de Jerusalém (50-51), descrito nos Atos dos Apóstolos, onde os apóstolos e anciãos decidiram em conjunto sobre as questões de fé e caminhada da Igreja, com sua abertura para evangelizar os “gentios”, respeitando a sua cultura, num processo de enculturação do evangelho que depois terá prosseguimento em outras fases da história.
Como os Concílios contribuíram para a vivência da sinodalidade?
Para entender bem a importância da sinodalidade precisamos voltar um pouco ao passado, sobretudo, nos tempos do Concílio Vaticano II (1962-1965) que se transformou num momento de grande renovação da Igreja.
O Concílio, que ainda não perdeu sua atualidade, trouxe novos ares para a Igreja, um tempo de mudança de conceitos eclesiais, de mentalidades e posturas da parte da Igreja, tendo se transformado numa ampla janela que levou a Igreja a se abrir a fim de arejar sua vida e sua ação.
Há exemplos de práticas sinodais durante a Idade Média ou na Igreja do Oriente?
Na Idade Média, tanto a convocação de concílios como o Quarto Concílio de Latrão (1215) demonstraram a prática da sinodalidade ao incluir a participação de figuras seculares e religiosos, como abades e até leigos.
Prejudicou muito o processo de separação entre a Igreja do Ocidente e Oriente, que levou à recíproca excomunhão entre o papa e o patriarca de Constantinopla no ano de 1054, que perdurou até o período posterior ao Vaticano II.
Quais eventos históricos marcaram avanços ou retrocessos na vivência da sinodalidade?
Favoreceu muito o princípio de “caminhar juntos” e da vida em comum que se desenvolveu muito nos primeiros séculos da Igreja através da prática da realização dos sínodos regionais e concílios.
Na vida religiosa consagrada se encontra fortemente uma expressão de sinodalidade.
Já na Idade Moderna, o Concílio de Trento incluiu a participação de emissários de chefes de estado, mostrando a influência crescente de diversos atores na tomada de decisões conciliares. Os efeitos desse concílio perduraram até os tempos contemporâneos.
Fonte: Portal A12 / Por Laís Silva



