A sensibilidade social nos Atos dos Apóstolos (parte 6)

Jesus de Nazaré um homem profundamente sensível que, no meio do povo, realizou milagres, prodígios e sinais de bondade

Introdução
A sensibilidade social de Jesus foi muito bem assimilada pelos doze, com exceção de Judas Iscariotes que, atraído pelo dinheiro, acabou-se tragicamente (cf. Mt 27,1-6). Por outro lado, a partir do testemunho presente nos diversos escritos do Novo Testamento, além dos Evangelhos, percebemos que as primeiras comunidades foram movidas por uma grande sensibilidade social. Comecemos esse aprofundamento a partir dos Atos dos Apóstolos.

É muito importante a que a catequese considere essa forte sensibilidade social das primeiras comunidades. Nelas não havia somente a liturgia e as celebrações da Fração do Pão (a Eucaristia), mas também um profundo compromisso de testemunho da Caridade que dava respostas concretas aos problemas comunitários e sociais. Vejamos alguns exemplos de sensibilidade social nos Atos dos Apóstolos.

1 – A viva memória de Jesus de Nazaré
As comunidades primitivas fizeram todo esforço possível para consolidar a memória viva de Jesus de Nazaré como um homem profundamente sensível que, no meio do povo, realizou milagres, prodígios e sinais de bondade (cf. At 2,22). Ele passou por toda parte, fazendo o bem e curando a todos (cf. At 10,38). Os apóstolos eram continuadores da sua missão com seus gestos, palavras e atitudes. Jesus continuava vivo através deles.

A rejeição da violência é um dos primeiros temas sociais tratados nos Atos dos apóstolos. Nos primeiros capítulos, encontramos não só o testemunho sobre a ressurreição de Jesus, mas também a paixão de Deus pela vida e a rejeição a toda e qualquer forma de violência (cf. At 2,24). Deus não quer o abandono de seus filhos no reino da morte e sempre lhes ensina os caminhos da vida (cf. At 2,27).

2 – Os retratos da comunidade primitiva
Nos diversos retratos da comunidade primitiva encontramos uma profunda sensibilidade social. As narrações, muito mais do que ressaltar fatos pontuais, nos apresentam o perfil moral da Comunidade. O primeiro retrato da comunidade primitiva apresenta a experiência de comunhão fraterna, prodígios e sinais que eram realizados pelos apóstolos (cf. At 2,42-43).

A sensibilidade social de uma comunidade cristã é consequência da qualidade da sua vida interna. Os que abraçavam a fé eram capazes de compartilhar o que tinham e, dessa forma, ninguém passava necessidade (cf. At 2,44-45). Essa qualidade de vida interna e a sensibilidade social da comunidade gerava impacto muito positivo e a comunidade crescia (cf. At 2,47). Ao contrário, o intimismo de uma comunidade, fechando-se em si mesma, produz consequências contrárias, e assim se empobrece, se enfraquece e morre.

No segundo retrato da comunidade primitiva diversas características sociais se repetem (cf. At 3,32-35), mas observamos outro elemento: o exemplo concreto de José, levita nascido em Chipre, apelidado pelos apóstolos com o nome de Barnabé, que significa «filho da exortação» que vendeu o campo que possuía, trouxe o dinheiro e o colocou aos pés dos apóstolos (cf. At 3,36-37). Esse exemplo nos diz que a sensibilidade social de uma comunidade é consequência da solidariedade dos seus comunitários.

No terceiro retrato da comunidade (cf. At 5,12-16), ressalta-se a grande sensibilidade que a comunidade tinha para com os doentes que até eram transportados em esteiras e macas para as praças “para que Pedro, ao passar, pelo menos a sua sombra cobrisse alguns deles” (At 5,15) e outros doentes de diversas cidades vizinhas também eram curados de males físicos e espirituais (cf. At 5,16). Neste terceiro retrato da comunidade primitiva podemos notar a evidente preocupação com a saúde integral das pessoas. Essa questão é sintetizada no milagre de Pedro e João na porta formosa do templo quando estavam indo para a oração das três horas da tarde. Os apóstolos rejeitaram o pedido de esmola daquele homem. Mas Pedro, lhe declarou: «Não tenho ouro nem prata, mas o que tenho eu lhe dou: em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, levante-se e comece a andar!» (At 3,7). Pedro o ajudou a levantar-se e o homem ficou curado (cf. At 3,7-8). A mensagem parece ser bem clara para os líderes da Igreja: eles não podem ser insensíveis diante das misérias humanas. Culto ao Senhor da vida e esmola, não combinam.

Nessa narração há outra questão importante: a Igreja dá a sua contribuição na promoção da dignidade humana em nome de Jesus Cristo e não por causa da política ou das ciências. Por isso disse Pedro com firmeza: “Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, levanta-te e anda” (At 3,7). Há uma íntima relação entre evangelização e promoção da dignidade humana.
Outro retrato da comunidade primitiva encontramos no capítulo nove dos Atos dos Apóstolos. Essa narração evidencia a experiência da Paz na comunidade, seu crescimento e a promoção da saúde ao apresentar a cura do paralítico Enéias, morador de Lida (cf. At 9,31-33) e da ressurreição de Tabita, a bondosa moradora de Jope (cf. At 9,38-43). A Evangelização é compromisso com a promoção da vida.

3 – Novas
necessidades, novos ministérios
A sensibilidade social da comunidade primitiva também foi evidenciada através da fundação de novos ministérios, como resposta comunitária diante do surgimento de novas necessidades. Uma vez que o número dos discípulos tinha aumentado, os fiéis de origem grega começaram a queixar-se contra os fiéis de origem hebraica dizendo que suas viúvas eram deixadas de lado no atendimento diário. A resposta a essa questão não foi a sobrecarga dos apóstolos, mas foi a promoção de novos servidores. É sinal de sensibilidade social de uma comunidade a convocação e capacitação de novos ministros (cf. At 6,1-6).

Outras situações sociais são acolhidas e geridas pelos Apóstolos como por exemplo:
– Em Listra Paulo cura um homem paralítico das pernas, coxo de nascença (cf. At 14,8);
– Em Filipos Lucas nos apresenta um caso de testemunho de libertação desmascarando a mentira, o enriquecimento ilícito e a opressão; era o caso de uma jovem escrava que era usada como meio de lucro por seus patrões (cf. At 16,16-24);
– Chegando em Atenas, Paulo não só observa a realidade da cidade mas também começa a dialogar em praça pública com alguns filósofos epicureus e estóicos (cf. At 16,18) e no areópago anuncia uma nova doutrina (cf. At 16,19); Paulo representa a Igreja que tem profunda consciência de sua identidade e é aberta ao diálogo com outras realidades e sujeitos;
– Em Éfeso Paulo se opõe a uma economia promotora da idolatria; os artesãos de ouro e prata que fabricavam peças em prol do culto da deusa Artêmis, liderados por Demétrio, se opuseram duramente a pregação de Paulo (cf. At 19,23-29);
– Enfim, para concluir esta reflexão recordemos a atitude de Paulo defendendo seus direitos apelando para a própria cidadania Romana desejando que o seu caso fosse julgado por César (cf. At 25,1-12); Paulo, enquanto o cidadão romano, apela para o direito de ter uma audiência com o imperador, uma vez que tinha a consciência de estar sofrendo injustiças no seu processo; os membros da Igreja não renunciam seus direitos civis, pois a esperada cidadania celeste compromete os discípulos de Jesus Cristo a cumprir seus deveres de cidadãos terrestres. Dizia São João Bosco para os seus estudantes que a meta da educação dada aos seus alunos era aquela de “formar bons cristãos e honestos cidadãos”.

PARA A REFLEXÃO PESSOAL:
1  – O que mais lhe chamou a atenção quanto à sensibilidade social nos Atos dos Apóstolos?
2 – Qual característica mais lhe chamou a atenção dos retratos da comunidade primitiva?
3 – Quais dos problemas sociais evidenciados ainda se fazem presentes em nossa sociedade?

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