Por Dom Alberto Taveira Corrêa

Temos no coração imensa gratidão, do tamanho da eternidade, por termos recebido o tesouro da fé cristã. Fazem parte da incontável quantidade de pessoas que para isso contribuíram a multidão de santos e santas, alguns conhecidos e outros anônimos, que nos ofereceram o testemunho da fé, a vida de Igreja, os valores que nos foram legados, demonstrados inclusive na linguagem usada em nossos ambientes, assim como no jeito de pensar e reagir de nossas pessoas e famílias. E não nos esqueçamos que a fé faz e edifica realmente uma cultura cristã, destinada a influenciar positivamente os ambientes em que nos encontramos. Na aproximação do Círio de Nazaré, basta observar que o grande evento essencialmente cristão e católico tem o poder de manifestar a tantas pessoas, algumas movidas apenas por curiosidade, a força do Evangelho e a presença mariana, no título e na devoção profundamente evangelizadora de Nossa Senhora de Nazaré.

Foto: Sandro Barbosa

   Vale a pena redescobrir os passos percorridos por tantos cristãos, começando pelos discípulos da primeira hora, dos apóstolos, para atualizar com força e disposição nosso caminho de fé (cf. Mc 8,27-35), e o fazemos a modo de uma pequena peregrinação espiritual, como alguém que busca o Santuário da Mãe e Modelo de fé, a Virgem de Nazaré!

         Há uma imensa multidão, espalhada pelos caminhos dos séculos, com todo tipo de gente, e nós aí estamos, buscando Deus, muitas vezes às apalpadelas (cf. At 17,16-23). Entramos todos nós pela porta da gentilidade e da misericórdia! É o que oferece a imagem das tantas pessoas que se acercavam de Jesus, muitas desejosas de tocá-lo, com a certeza de encontrarem não só a cura de suas eventuais enfermidades e dificuldades, mas, lá dentro, o sentido da vida que só em Deus se pode achar. Tenhamos a coragem de recolher em nossa mente as perguntas e questionamentos ocorridos em nossa história, nossas eventuais revoltas e dúvidas, as vezes em que culpamos a Deus, mesmo sem conhecê-lo bem, dos problemas enfrentados. Tudo isso seja colocado, como num pacote de presente misterioso e complexo!

         Da multidão saíram as respostas à pergunta de Jesus, numa espécie de pesquisa de opinião, dessas tão comuns nos dias eleitoreiros em que nos encontramos! Jesus é João Batista, Elias, um dos Profetas? Ou hoje alguns o chamam apenas de Mestre, outros o colocam em pé de igualdade com outros iniciadores de movimentos religiosos de toda ordem! Há até gente que pensa que escreveu livros, quando a única escrita de seu dedo na areia foi logo apagada pelo vento!E ele é único, pois é Palavra de Deus que se fez Carne, Filho Unigênito do Pai! Pode acontecer que até muitos cristãos nivelem tudo em pé de igualdade, pois, afinal, existe a liberdade religiosa! Aliás, só para não nos esquecermos, o próprio diálogo religioso só pode ser autêntico quando aqueles que nele se envolvem estiverem absolutamente convictos de suas escolhas, sabendo respeitar, mas sem confundir, aquele que pensa diferente!

         Do meio da multidão, vêm à tona os que acolhem a Palavra e se tornam discípulos. Recebido o primeiro anúncio, chamado Querigma, inicia-se o processo de seguimento, para aprender do próprio Senhor e de seus discípulos já iniciados na fé, o que é ser cristão. Descobre-se que ninguém fala como Ele (cf. Jo 7,45-49), a pessoa começa a praticar o que o Senhor vive e faz! Há um caminho a ser percorrido, e para todos nós, que desejamos refazer de modo corajoso nossas opções, uma proposta é viver a Palavra, como alguém que se deixa de novo alfabetizar, quem sabe, uma Palavra do Evangelho por dia, buscando depois partilhar com irmãos e irmãs os frutos de tal prática. E o acompanhamento do processo acontece através da catequese. Lembremo-nos de que podemos refazer os passos, olhando para o modelo da Iniciação Cristã!

         Todos nós, conduzidos pelo Espírito, nascidos nas águas do Batismo, buscamos depois uma vida de oração e comunhão com Deus! Aqui, colocamos em relevo a liberdade com a qual podemos dirigir-nos ao Senhor, com simplicidade e autenticidade!

         Todo este processo é acompanhado pela prática sacramental que buscamos. A iniciação à vida cristã se completa com a Eucaristia, Mesa do Senhor, alimento para a vida eterna, e a Crisma, com o Dom do Espírito Santo para o apostolado, quando brota no coração o desejo missionário de comunicar aos outros o que recebemos e vivemos. Mas tudo isso se realiza em Comunidade, a Vida da Igreja, especialmente na Paróquia, onde tudo deve contribuir para o crescimento e amadurecimento na fé. E somos responsáveis uns pelos outros!

         Parece simples, mas o processo da caminhada da fé traz consigo as dificuldades. Depois da confissão de fé feita por Simão Pedro, certamente Jesus se animou e decidiu anunciar aos discípulos o Sofrimento, a Morte na Cruz e a Ressurreição. Ficaram tão apavorados que nem devem ter prestado atenção à certeza da Ressurreição. E Simão Pedro, atrevidamente, repreende Jesus! À altura de nosso caminho de fé, com toda certeza fomos surpreendidos com os anúncios e a realidade da dor, do sofrimento e da morte! E haveremos de ouvir, centenas de vezes, as palavras fortes e exigentes de Jesus: “Jesus chamou, então, a multidão, juntamente com os discípulos, e disse-lhes: ‘Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me! Pois quem quiser salvar sua vida a perderá; mas quem perder sua vida por causa de mim e do Evangelho, a salvará’” (Mc 8,34-35). E uma nova escolha de seguimento de Jesus aconteceu com os primeiros discípulos e há de acontecer conosco.

         Enfim, a fé professada e purificada se manifesta na prática do Evangelho, especialmente o serviço da caridade, como indica a carta de São Tiago na Liturgia do vigésimo quarto Domingodo Tempo Comum: “Meus irmãos, que adianta alguém dizer que tem fé, quando não  tem as obras? A fé seria capaz de salvá-lo? Imaginai que um irmão ou uma irmã não têm o que vestir e que lhes falta a comida de cada dia; se então algum de vós disser a eles: “Ide em paz, aquecei-vos” e “Comei à vontade”, sem lhes dar o necessário para o corpo, que adianta isso? Assim também a fé: se não se traduz em ações, por si só está morta” (Tg 2,14-17).

         Encontro com o Senhor, Seguimento, Configuração com Cristo, Vida em Comunidade, escuta e prática da Palavra de Deus, Vida Sacramental, Força para abraçar a Cruz, Testemunho de Caridade e Missão! Uma descrição do caminho da fé, ao qual somos todos convidados e desafiados à sua renovação.

Colunistas