Durante estas semanas, temos assistido a uma série de entrevistas e todo tipo de propaganda daqueles que se candidatam aos cargos políticos de administradores municipais e de vereadores, inclusive com espetáculos vergonhosos e deprimentes em algumas partes do país. De um lado, vivemos um tempo de exercício da democracia, na qual são assegurados direitos de se apresentarem como possíveis ocupantes das cadeiras existentes à disposição. Por outro lado, percebemos a enxurrada de propostas, tantas delas irrealizáveis, inclusive com grande confusão entre os papéis dos prefeitos ou prefeitas e aquele dos vereadores e vereadoras.
De fato, é bom fazermos um significativo desconto ao ouvirmos de candidatos às Câmaras Municipais propostas de um verdadeiro paraíso na terra, como se coubesse a esta instância realizar as obras ligadas à Educação, Habitação, Saúde, Saneamento e daí por diante. Ensina o Tribunal Superior Eleitoral: “O vereador é a ligação entre o governo e o povo. Ele tem o poder de ouvir o que os eleitores querem, propor e aprovar esses pedidos na câmara municipal e fiscalizar se o prefeito e seus secretários estão colocando essas demandas em prática. Por isso, é importante que o eleitor acompanhe a atuação do vereador para verificar se o trabalho está sendo bem desenvolvido”.
Quando uma pessoa prioriza sua candidatura na defesa de interesses grupais ou classistas, ainda que justos, corre o risco de esquecer outros aspectos. Antes de tudo, o sentido do “bem comum”, o primeiro princípio da Doutrina Social da Igreja. Outro é o papel prioritário de fiscalização do exercício administrativo do poder executivo. Não passando pelo bem comum, os interesses particulares ou de grupos em vista de cargos ou posições comprometem a segunda parte, fiscalizar com isenção o poder executivo. Por acaso, alguém sabe de cargos conseguidos à custa de barganhas e posições oferecidas a parentes e apaniguados? Vale a pergunta provocante!
Jesus chamou para seu grupo de discípulos homens bem concretos, com qualidades e limitações, inclusive porque o ambiente da época levava à expectativa de um Messias poderoso, capaz de enfrentar e aniquilar os inimigos do povo. Ele fez com os discípulos um caminho de formação, um lento processo que incluiu o que devemos ouvir na Liturgia deste final de semana (cf. Mc 9,30-37). Vejamos: “Chegaram a Cafarnaum. Estando em casa, Jesus perguntou-lhes: “Que discutíeis pelo caminho?” Eles, no entanto, ficaram calados, porque pelo caminho tinham discutido quem era o maior. Jesus sentou-se, chamou os Doze e lhes disse: “Se alguém quiser ser o primeiro, seja o último de todos, aquele que serve a todos!” Em seguida, pegou uma criança, colocou-a no meio deles e, abraçando-a, disse: “Quem acolhe em meu nome uma destas crianças, a mim acolhe. E quem me acolhe, acolhe, não a mim, mas àquele que me enviou” (Mc 9,33-37).Justamente aos Doze, que viriam a assumir responsabilidades tão grandes, Jesus deve ensinar a não buscar os lugares de predominância e prepotência. E chama uma criança para mostrar-lhes a preferência a ser assumida, justamente num ambiente cultural em que estes pequeninos nem eram contados!
Permitam-me as pessoas que acompanham esta reflexão algumas observações e propostas, justamente às vésperas das eleições municipais. Observo que, nos muitos anos de vida e ministério, já conheci e conheço pessoas que entraram na política e se mantiveram com as mãos limpas e o coração puro, inclusive saindo até mais pobres do que entraram ao final de uma carreira! Um critério a ser observado, quando nos cabe dar um voto consciente, é verificar se a pessoa tem, efetivamente, uma história de serviço ao próximo, retidão e coerência de vida, começando em sua própria família e no ambiente de trabalho. Nas atividades comunitárias, no bairro ou na Paróquia, vejamos se a pessoa se dispôs, realmente, a ir ao encontro dos mais fracos e dos mais pobres. E é bom saber se tem trabalhado seriamente em sua profissão, pois podem aparecer candidatos que procuram apenas um bom salário ou um dinheirinho extra!
Notemos ainda que os campos social e religioso não sejam misturados. Os lobbys de qualquer ordem, como no exemplo do Congresso Nacional, têm atrasado a consecução de objetivos e projetos mais amplos e dignos do conjunto da sociedade. O espaço da política há de ser o lugar do debate correto e sincero sobre a sociedade e o bem comum. Não interessa à Igreja Católica que candidatos prometam terrenos ou benefícios materiais ou cargos. O que desejamos é ter homens e mulheres que vivam com coerência o Evangelho e deem testemunho dos valores cristãos. Seja em que instância venham à tona debates, pessoas que não valorizam a vida e a dignidade humana desde a sua geração até o ocaso natural não podem merecer nossa confiança. Ou candidatos que já se envolveram em falcatruas e redes de corrupção de qualquer tipo, também estes não serão merecedores dos votos dos cristãos católicos. Não estão à venda votos de pessoas conscientes de sua fé e de sua retidão humana, por nenhum preço!
Então, muitas pessoas têm perguntado em quem votar! Vale a resposta dada pelo Papa numa entrevista, ao voltar da última Viagem Apostólica, quando afirmou que, em algumas circunstâncias, há que votar no “menos pior”. Entretanto, será sempre melhor analisar com calma para sufragar os candidatos ou candidatas aos poderes Executivo e Legislativo de nossos Municípios pessoas dignas e honestas. A responsabilidade pessoal nas eleições é imensa! Tenhamos a certeza de que o processo de construção de uma sociedade mais justa e fraterna é longo, complicado e muitas vezes doloroso, mas pede nossa consciência e capacidade de decisão. Peçamos, humildemente, àquele que veio não para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos (cf. Mt 20,28)! Dele nos vem a graça e o exemplo!