Por uma Igreja Sinodal: não simples democracia

O Documento Preparatório (DP) para o Sínodo 2023 ao apresentar a sinodalidade como elemento constitutivo da Igreja, o faz citando as raízes teológicas de tal afirmação, como se encontra no Concílio Vaticano II quando lembra que “em virtude da unção do Espírito Santo recebida no Batismo, a totalidade dos Fiéis “não pode enganar-se na fé; e esta sua propriedade peculiar manifesta-se por meio do sentir sobrenatural da fé do Povo todo quando este, ‘desde os Bispos até ao último dos Fiéis leigos’, manifesta o consenso universal em matéria de fé e de moral” (LG, n. 12). E mais em frente, no mesmo n. 13 do DP, cita: “este Povo, reunido pelos seus Pastores, adere ao depósito sagrado da Palavra de Deus confiado à Igreja, persevera constantemente no ensinamento dos Apóstolos, na comunhão fraterna, na fração do pão e na oração, “de tal modo que, na conservação, atuação e profissão da fé transmitida, haja uma especial concordância de espírito entre os Pastores e os Fiéis” (DV, n. 10).

A este ponto o DP, no n. 14, faz uma advertência aos Pastores da Igreja: “não tenham medo de se colocar à escuta da Grei que lhes for confiada: a consulta do Povo de Deus não exige a assunção, no seio da Igreja, dos dinamismos da democracia centrados no princípio de maioria, uma vez que na base da participação em qualquer processo sinodal está a paixão partilhada pela missão comum de evangelização, e não a representação de interesses em conflito”. Isto quer dizer sim que, em se tratando de um processo eclesial, onde a busca da comunhão é primordial, em obediência ao Espírito Santo, não se cairá nas contradições de uma simples democracia em que as decisões são tomadas em base dos votos da maioria. Sinodalidade é uma realidade eclesial, não apenas realidade sociológica; daí a confiança de que é “na fecunda ligação entre o sensusfidei do Povo de Deus e a função magisterial dos Pastores que se realiza o consenso unânime de toda a Igreja na mesma fé”. No processo sinodalos Bispos são chamados a discernir aquilo que o Espírito diz à Igreja, não sozinhos, mas ouvindo o Povo de Deus, que “participa também da função profética de Cristo” (LG, n. 12). É este“caminhar juntos” que faz crescer a Igreja. São Bento registra na sua história que “muitas vezes o Senhor revela a melhor decisão” a quem não ocupa posições relevantes na comunidade (neste caso, o mais jovem) (Regra 3,3). Assim os Bispos tenham o cuidado de alcançar todos, a fim de que no desenrolar ordenado do caminho sinodal se realize aquilo que o apóstolo Paulo recomenda às comunidades: “Não extingais o Espírito. Não desprezeis as profecias. Examinai tudo: abraçai o que é bom” (1 Ts 5, 19-21).

Este é o sentido do caminho ao qual todos somos chamados, isto é, descobrir o rosto e a forma de uma Igreja sinodal, na qual“cada um tem algo a aprender: Povo fiel, Colégio episcopal, Bispo de Roma. Cada um à escuta dos outros; e todos à escuta do Espírito Santo, o “Espírito da verdade” (Jo 14, 17), para conhecer aquilo que Ele “diz às Igrejas” (Ap 2, 7).

O n. 15 do DP insiste: “O Bispo de Roma, como princípio e fundamento de unidade da Igreja, pede que todos os Bispos e todas as Igrejas particulares, nas quais e a partir das quais existe a Igreja católica una e única (cf. LG, n. 23), entrem com confiança e coragem no caminho da sinodalidade. Neste “caminhar juntos”, peçamos ao Espírito que nos leve a descobrir como a comunhão, que compõe na unidade a variedade dos dons, dos carismas e dos ministérios, tem em vista a missão: uma Igreja sinodal é uma Igreja “em saída”, uma Igreja missionária, “com as portas abertas” (EG, n. 46). Isto inclui o chamado a aprofundar as relações com as outras Igrejas e comunidades cristãs, com as quais estamos unidos mediante o único Batismo. Além disso, a perspectiva de “caminhar juntos” é ainda mais ampla e abrange toda a humanidade, da qual compartilhamos “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias” (GS, n. 1). Uma Igreja sinodal é um sinal profético, sobretudo, para uma comunidade de nações incapaz de propor um projeto partilhado, através do qual perseguir o bem de todos: praticar a sinodalidade é, hoje para a Igreja, a maneira mais evidente de ser “sacramento universal da salvação” (LG, n. 48), “sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano” (LG, n. 1).

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