Na semana passada, nesta coluna, citei que uma atitude sinodal é aquela que desenvolve “processos de discernimento comunitário”, isto é, processos que buscam perceber as autênticas manifestações do sensus fidei”. O que significa esta expressão “o sentido da fé dos fiéis”?

Um artigo da “Comissão Teológica Internacional” (ligada ao Dicastério da Doutrina da Fé), em artigo publicado a um tempo atrás, responde assim: “Por meio do dom do Espírito Santo, “o Espírito da verdade, que vem do Pai” e que dá testemunho do Filho (Jo 15,26), todos os batizados participam da missão profética de Jesus Cristo, “a testemunha fiel e verdadeira” (Apoc 3,14). Eles precisam dar testemunho do Evangelho e da fé dos apóstolos na Igreja e no mundo. O Espírito Santo lhes dá a unção e dons para esta alta vocação, conferindo-lhes um conhecimento muito pessoal e íntimo da fé da Igreja. Na sua primeira carta, são João diz aos fiéis: “vós, porém, tendes a unção que vem do Santo, e todos vós possuis a ciência”, “a unção que recebestes dele [Cristo] permanece em vós, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine (…) mas como sua unção vos ensina tudo” (1Jo 2,20.27)”.

Daí decorre que “os fiéis têm um instinto para a verdade do Evangelho, o que lhes permite reconhecer quais são a doutrina e prática cristãs autênticas e a elas aderir. Esse instinto sobrenatural, que tem uma ligação intrínseca com o dom da fé recebido na comunhão da Igreja, é chamado de sensus fidei, e permite aos cristãos cumprir a sua vocação profética. Em seu primeiro Angelus, o Papa Francisco citou as palavras de uma senhora idosa humilde, que ele havia encontrado certa vez: “Se o Senhor não perdoa tudo, o mundo não existiria”; e o Papa comenta com admiração: “Essa é a sabedoria dada pelo Espírito Santo”. A intuição dessa mulher é uma manifestação marcante do sensus fidei, que, ao mesmo tempo, lhe permite algum discernimento no que diz respeito às questões de fé, nutre a verdadeira sabedoria e suscita a proclamação da verdade, como neste caso. É, portanto, claro que o sensus fidei representa um recurso vital para a nova evangelização, que é um dos principais compromissos da Igreja de hoje”.

E continua o artigo dizendo que “de uma parte, o sensus fidei refere-se à aptidão pessoal que tem um crente, no seio da comunhão da Igreja, para discernir a verdade da fé. Por outro lado, o sensus fidei refere-se a uma realidade comunitária e eclesial: o instinto da fé da própria Igreja, por meio do qual ela reconhece o seu Senhor e proclama sua palavra. O sensus fidei entendido neste sentido se reflete no fato de que os batizados convergem em uma adesão vital a uma doutrina de fé ou a um elemento da práxis cristã. Esta convergência (consensus) desempenha um papel vital na Igreja. O consensus fidelium é um critério seguro para determinar se uma doutrina ou uma determinada prática faz parte da fé apostólica”.

E no n. 4 o artigo cita que “a importância do sensus fidei na vida da Igreja foi fortemente enfatizada pelo Concílio Vaticano II. Descartando a representação distorcida de uma hierarquia ativa e um laicato passivo e, particularmente, a noção de uma rigorosa separação entre a Igreja docente (Ecclesia docens) e a Igreja discente (Ecclesia discens), o Concílio ensinou que todos os batizados participam, cada um a seu modo, dos três ofícios de Cristo, profeta, sacerdote e rei. Em particular, ele ensinou que Cristo cumpre o seu papel profético não só através da hierarquia, mas também por meio dos leigos”.

Surgem certamente algumas perguntas que precisam ser respondidas: – O que exatamente é o sensus fidei, e como se pode identificá-lo? – Quais são as fontes bíblicas dessa ideia e qual é a função do sensus fidei na tradição de fé? – Qual é a relação do sensus fidei do Magistério eclesiástico do Papa e dos bispos, assim como da teologia? – Quais são as condições para um autêntico exercício do sensus fidei? – O sensus fidei é algo diferente do que a opinião da maioria dos fiéis em um determinado tempo e lugar? – E se isso acontecer, como ele se diferencia? – A estas perguntas é necessário responder, para que a ideia de sensus fidei seja compreendida mais perfeitamente e utilizada com mais confiança na Igreja de hoje. Aguardem as próximas publicações.

O processo sinodal que nós estamos vivendo rumo nosso primeiro sínodo arquidiocesano e também rumo à assembleia eclesial latino-americana é uma atuação desta verdade: a Igreja é o povo de Deus que faz um caminho junto. 

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