Um amor forte e cheio de ternura

A história do Povo de Deus, no Antigo Testamento, é um perene jogo de amor entre Deus e aqueles que por ele foram escolhidos, e estes carregam o peso de sua humanidade, suas faltas, traições e pecados, enquanto o Senhor sempre se dobra em misericórdia, perdoando pessoas e grupos que se arrependem e querem recomeçar, por vezes incontáveis. Deus sabe que há um processo de conversão lenta e custosa: “Como poderia eu abandonar-te, Efraim? Como poderia entregar-te, Israel? Poderia abandonar-te como a cidade de Adama? Ou eu poderia tratar-te igual a Seboim? O coração se comove no meu peito, as entranhas se agitam dentro em mim! Não me deixarei levar pelo calor de minha ira. Não, não destruirei Efraim! Eu sou Deus, não um ser humano, sou o Santo no meio de ti, não venho com terror! Eles hão de vir em busca do Senhor. O Senhor há de rugir como leão e, quando ele rugir, seus filhos acudirão lá do ocidente, do Egito virão voando como pássaros, como pombos, da região da Assíria. Então, eu os farei morar em suas próprias casas” – oráculo do Senhor!” (cf.Os 11,8-11)

A Liturgia do décimo sexto Domingo do Tempo Comum apresenta o Profeta Jeremias (Jr 23,1-6), anunciando que, diante das fraquezas e dispersão do Povo, ele mesmo, o Senhor, descerá para cuidar, em primeira pessoa, do rebanho disperso. E o profeta anuncia, em nome de Deus, que “um dia chegará quando farei brotar para Davi um rebento justo! Ele reinará de verdade e com sabedoria, porá em prática no país a justiça e o direito (Jr 23,5). Trata-se de uma palavra com o tom de anúncio messiânico, daquele que devia vir com sabedoria, justiça e direito. Seu nome, “Senhor-Nossa-Justiça”. Ele devia vir para colocar em prática a justiça de Deus, agir de acordo com a sua vontade! E em todos os tempos, pessoas e povos sábios “sabem” aguardar o tempo de Deus e a realização de suas promessas.

O Apóstolo São Paulo tem a clareza de que Jesus Cristo “é a nossa paz: de dois povos fez um só povo, em sua carne derrubando o muro da inimizade que os separava e abolindo a Lei com seus mandamentos e exigências. Ele quis, assim, dos dois povos formar em si mesmo um só homem novo, estabelecendo a paz e reconciliando os dois com Deus, em um só corpo, mediante a cruz, na qual matou a inimizade. Veio anunciar a paz: paz para vós que estáveis longe e paz para os que estavam perto” (Ef 2,14-17). “Senhor-Nossa-Justiça” está presente, para derrubar todos os muros de separação, criar um só homem novo, mediante a Cruz, estabelecendo a paz!

E a Boa Nova do Evangelho (Mc 6,30-34) do Domingo, Dia do Senhor, que celebramos, nos apresenta a realização das promessas naquele que é de verdade o Bom Pastor. De verdade, “há diferença entre o bom e o mau pastor: o Bom Pastor tem em mira o bem do rebanho, enquanto aquele que é mau busca seus próprios interesses. O Bom Pastor consagra sua vida ao exercício da autoridade e da caridade. Cristo nos deu o exemplo: ‘Se deu a sua vida por nós, também nós devemos dar a vida pelos irmãos’” (cf. São Tomás de Aquino, Exposição sobre João, 10).

A certa altura, Jesus convoca seus discípulos a um lugar separado, para descansar. O mesmo Senhor que os enviara descrevendo as provações e dificuldades a serem enfrentadas, pensa agora com ternura no descanso de seus amigos. Muitas pessoas, nestes tempos de férias, podem até descobrir aqui o sentido de seu lazer e repouso, esportes, praias, passeio e turismo! Deus nos chama também ao descanso! Com os discípulos de Jesus, sabemos que este descanso durou pouco! “Muitos os viram partir e perceberam a intenção; saíram então de todas as cidades e, a pé, correram à frente e chegaram lá antes deles. Ao sair do barco, Jesus viu uma grande multidão e encheu-se de compaixão por eles, porque eram como ovelhas que não têm pastor” (Mc 6,33-34). Ternura para com pobres, pecadores, enfermos e todos os sofredores!

Força quando chama, anuncia o mistério da Cruz, alerta para as provações, vai à frente, é preso, torturado, crucificado e morto, para depois ressuscitar! E quem quer ser discípulo, em todos os tempos, haverá de percorrer a mesma estrada.

Força e ternura! Desafios para o nosso tempo e para o exercício de qualquer autoridade que nos seja confiada. É necessário ter coragem e ousadia para assumir a disposição a dar a vida pelos irmãos que nos são confiados a qualquer título. Fortes são os homens e mulheres que assumem a missão da paternidade e da maternidade, sabendo ter chegada a hora de doar-se para multiplicar os filhos e filhas a serem dados a Deus e ao mundo, aqui visto num sentido positivo. Cheio de ternura deverá ser o relacionamento familiar, superando desconfianças e agressões.

Força e ternura! Fortes são os irmãos e irmãs que aceitam o convite a deixar tudo numa vida de consagração a Deus, nas diversas formas existentes na Igreja. Cheia de ternura deverá ser a vida em comunidade a que estes são chamados, com sobriedade, castidade e verdade. Fortes e ternos deverão ser os Bispos, Presbíteros e Diáconos, chamados ao ministério ordenado, firmes na fé, anunciadores ardorosos do Evangelho, corajosos no serviço e revestidos da caridade no relacionamento com o próximo.

Fortes e ternos deverão ser todos os discípulos e discípulas de Jesus, em todos os tempos, para que vendo suas boas obras, todos glorifiquem o Pai que está nos Céus (cf. Mt 5,16).

Podemos trazer à memória a letra de uma preciosa canção, que nos fortalece na força e na ternura: “A tua ternura, Senhor, vem me abraçar e a tua bondade infinita me perdoar. Vou ser o teu seguidor e te dar o meu coração, eu quero sentir o calor de tuas mãos. A ti, meu Deus, elevo meu coração, elevo as minhas mãos, meu olhar, minha voz. A ti, meu Deus, eu quero oferecer meus passos e meu viver, meus caminhos, meu sofrer. A ti, meu Deus que és bom e que tens amor, ao pobre, ao sofredor vou servir, esperar. Em ti, meu Deus, humildes se alegrarão, cantando a nova canção de esperança e de paz” (Frei Fabreti).

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