Um pequeno grande livro (25)

Continuemos os feitos de Dom Hélder Câmara no tempo em que bispo auxiliar de Dom Jaime de Barros Câmara, arcebispo do Rio de Janeiro. Uma coincidência: ambos tinham o mesmo sobrenome, Câmara, muito embora não fossem parentes.

Sua grande capacidade de articulação possibilitou a realização lá, em 1955, do 36º Congresso Eucarístico Internacional, para o que foi preciso aterrar-se uma parte da Baía de Guanabara, no Flamengo, hoje popularmente conhecida como aterro do Flamengo.

A título de curiosidades: à época eu acabara de chegar ao Rio em busca de emprego, incentivado por um companheiro de trabalho na Companhia Internacional de Seguros aqui em Belém, o Laércio, que lá já estava.

“Se eu, que não tenho o estudo que tiveste no Seminário, facilmente arranjei aqui um bom emprego, quanto mais tu. Trata de vir o quanto antes. É só me avisares o dia e a hora do teu voo, que estarei à tua espera no aeroporto. Fui num avião da FAB, voo pinga-pinga, vaga conseguida à última hora por uma jovem apaixonada por mim, coitada, quanto mau gosto!

Em casa menti à minha família, dizendo que estava indo para o Congresso Eucarístico, quando, na verdade, pretendia ficar por lá.

– Então, por que estás levando a Rosa Palmeirão (minha maquininha portátil de escrever, cujo nome uma homenagem a um dos personagens femininos de um dos romances de Jorge Amado) e tudo o mais que é teu? – perguntou minha mãe.

– Doidice minha, respondi.

– Tá bom. Feliz viagem e breve retorno. Deus te abençoe.

No táxi rumo ao aeroporto, fui chorando o tempo todo por ter mentido em casa, uma vez que, como escrevi linhas acima, minha intenção era me empregar e ficar por lá. Cheguei ao Rio, num sábado à tarde, véspera da abertura do Congresso Eucarístico. O aeroporto fervilhava, gente chegando de todas as partes do mundo, e nada do Laércio. Só chegou duas horas depois, atrasado como sempre.

Enquanto o esperava, senti-me como uma pobre formiguinha perdida na imensidão do deserto.

Levou-me a uma pensãozinha barata, contígua ao palácio São Joaquim, então sede da arquidiocese do Rio de Janeiro. Estava lotada. A maioria dos hóspedes era constituída por paraenses, o tal exército do Pará, como denominava nossa saudosa cronista Eneida de Moraes aos migrantes paraenses, também ela um deles, embora forçada pelas circunstância, obrigada a deixar sua terra por perseguição política.

Como os ocupantes de um dos quartos eram paraenses, todos amigos do Laércio, deixaram-me pernoitar nele, uma vez que passariam a noite fora, na farra, só devendo voltar no dia seguinte, sabe Deus a que horas.

Deixei minhas coisas na pensão e saí para dar uma voltinha pela redondeza. Na praça do Congresso, por sorte, encontrei o hoje cônego Raul Tavares, então seminarista no Rio, que me levou a Dom Mário, nosso arcebispo, que tinha por mim, imerecidamente, um carinho todo especial. O que, então, aconteceu veremos na próxima edição de “Miscelânea”, que esta chegou ao fim.

Até lá. Shalom!

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