“Abram as portas os seus frontões, abram os portões antigos, para que entre o Rei da glória. Quem é este Rei da glória? É o Senhor, forte e poderoso, o Senhor poderoso no combate” (Sl 23/24, 7-8). Os magos foram do oriente a Belém, conduzidos pela estrela de sua busca da verdade. Levaram o que tinham de melhor, a adoração àquele que é Deus, o respeito ao que é Rei e a homenagem ao que é tão humano que viria a passar pelo sofrimento e pela morte. Passaram por estradas abertas pelo deserto, parecidas com aquelas que foram sonhadas no exílio pelo Povo de Deus. As intempéries do clima não lhes impediram a busca da meta. Em Jerusalém, encontraram, de um lado, uma leitura das antigas profecias, mas estas cercadas de interesses outros, que depois se revelaram na sanha assassina de Herodes e seus asseclas. Mesmo assim, a estrela lhes abriu os caminhos, até porque foram também eles feitos para Deus e não poderiam acalmar sua busca enquanto não encontrassem o Rei que havia nascido.
Em Belém, certamente encontraram portas abertas, talvez nem portas, mas aberturas de uma tenda de gente pobre. Depararam com uma cena presente em todos os povos, desde que o mundo é mundo: pai, mãe, criança no colo! Não havia bloqueios, nem recepcionistas, nem condições prévias, para adentrarem àquele palácio real inusitado. Tudo era sóbrio e simples, nenhuma coisa supérflua, a cena adequada para a oração, o respeito e a troca de presentes. Homens ricos vindos de longe se agregaram aos primeiros que tinham ouvido anjos cantando, pobres pastores dos arredores da pequena vila de Belém, que agora revela sua vocação: “E tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor entre as principais cidades de Judá, porque de ti sairá um príncipe que será o pastor do meu povo, Israel” (Mt 2,6). Contentes com o serviço da estrela e com o encontro vivido, voltam às suas casas, passando por outros e novos caminhos, só por Deus conhecidos. Levaram seus alforjes vazios de riquezas, mas cheios de vida e de fé.
Podemos mudar de Belém para Belém. Nossa Igreja começa o ano novo de 2020 sob a égide de seu primeiro Sínodo Arquidiocesano, com o tema “Belém, Igreja de Portas Abertas”. Assumimos como lema a palavra dos Atos dos Apóstolos 8,8: “A cidade se encheu de alegria”. Dentre os muitos desafios à Evangelização da Amazônia, temos descoberto como vocação própria a grande cidade, pois Deus nos deu a graça de sermos uma metrópole plantada no portal de nossa grande região. Sonhamos alto! Queremos ser “epifania” – manifestação da presença de Deus e de seu plano de amor nesta terra.
Para tanto, abramos primeiro as portas para Deus! É um jogo de amor a procura que fazemos, como fizeram os magos, desejando encontrar o Senhor e, no entanto, ele mesmo vem a nós e nos procura, aquele que tem sede de nossa fé, como manifestou à mulher samaritana (Cf. Jo 4,1-26). Deus quer vir ao nosso encontro e espera que esteja aberta a porta de nosso coração. Caiam todas as resistências e desconfianças que eventualmente existam em nós. Sejam desmoronados todos os muros criados pela nossa condição de pecadores. A oração da Igreja faça que as muralhas de Jericó continuamente reconstruídas, venham a ruir e o Senhor possa entrar! (Cf. Js 6,1-27).
Quais são os espaços e os ambientes humanos mais resistentes a Deus, à Igreja e à prática da fé? Alguém pode elencar os novos condomínios, fechados às expressões religiosas, com o argumento da diversidade e do respeito a quem é ou pensa de modo diferente. E quando ali reside uma pessoa ou família com espírito missionário, as dificuldades são superadas e as portas se abrem! Ou quando Maria “passa na frente”, no Círio de Nazaré, ninguém resiste! O caminho passa pelo coração e não pela portaria dos prédios! Outros dirão que é mais difícil chegar às periferias, ou até afirmam que a pobreza impede a chegada da Igreja. Entretanto, nossa Arquidiocese pode listar a quantidade e a qualidade de Paróquias, Comunidades, Capelas, Grupos, Pastorais e Movimentos que vicejam justamente no meio dos mais pobres, e o Evangelho chega e converte pessoas, suscita a fraternidade, vai ao encontro dos mais sofredores. E a indiferença que se espalha, ou o ambiente das elites intelectuais ou as Universidades? Ali também a semente da Palavra de Deus floresce, e o mais decisivo será o testemunho de vida, pois, onde quer que nos encontremos, alguém pode discutir doutrinas e questioná-las, mas a vivência autêntica do Evangelho é irresistível!
Voltando aos magos chegados do oriente, se não temos desertos para olhar ao longe, temos muitas águas e florestas, além da imensidão de ideias e sonhos das pessoas com as quais convivemos. Desejamos abrir as portas de Igreja primeiro àqueles que estão mais distantes. Nosso amor seja capaz de alcançar as pessoas que trazem no coração e na mente interrogações, dúvidas e provocações. Não tenhamos medo do diferente, antes, acolhamos a todos, descobrindo o que pensam da Igreja, mesmo se a julguem ou condenem. Na Epifania que celebramos, nossa proposta é que cada cristão consciente de sua vocação e missão, arranje um modo de “apadrinhar” alguém que esteja distante da Igreja. Pode ser a inserção de uma pessoa num grupo nas redes sociais, pode ser a visita a um parente com o qual o relacionamento se tornou complicado, pode ser uma carta ou uma chamada telefônica. Alguns poderão enviar textos da Palavra de Deus a quem se abre para ela. Outros escolherão o caminho do testemunho silencioso, com o qual os valores do Evangelho começam a corroer as resistências, mesmo do coração de pessoas arredias. Importa começar um processo, assumir como perspectiva de vida cristã a militância, com a coragem de testemunhar um mundo novo e melhor, que começa no coração de cada pessoa que se abre a Cristo. E, quem sabe, nossas Paróquias estabeleçam plantões de atendimento e de oração para pessoas que se sintam perdidas e sofridas, trabalho que pode ser muito bem feito pelos nossos grupos do Encontro de Casais com Cristo e pela Pastoral Familiar. E podemos ainda propor que as portas de nossas Paróquias, Comunidades e Capelas se abram mais ainda a partir de agora, estabelecendo e divulgando horários de missas, confissões, direção espiritual e aconselhamento e as ações sociais, como já mostra a experiência de muitas delas. Não faltará a criatividade, com a qual muitas chaves aparecerão, para que outras portas se abram!
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Conversa com meu povo: Portas abertas
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